Teoria e prática no ensino de Design: de onde viemos, onde estamos e para onde vamos? (parte II)

Hugo Cristo
25 min readJan 7, 2021

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Na primeira parte desta série, publicada há mais de um ano, escrevi sobre o ensino da prática do design a partir da minha experiência entre 1998 e 2003 como estudante da Ufes.

O [longo] intervalo entre os textos foi proposital. Planejei escrever sobre o assunto durante os recessos acadêmicos, enquanto penso sobre a carreira e o ano que está por vir. Como ninguém contava com 2020 (já foi tarde), a esta segunda reflexão é mais complexa e pessimista que a anterior.

A pandemia nos fez repens@$]&$-(%&*#-resiliência$-%*reinventar*-&@($~@%$novo#@normal. Coisa nenhuma. Se 2020 teve utilidade, foi para escancarar anos (décadas, séculos) de omissões sistemáticas, improvisos, puxadinhos e ingerências do processo educacional. Procurei manter este segundo texto distante das dificuldades efetivamente causadas pela adoção do ensino remoto emergencial.

Nota 1: Para facilitar a sinalização das abordagens, aquela representada pelo Prof. Ronaldo Barbosa no texto anterior será referida como “design normal”, enquanto a abordagem representada pela Profª Heliana Pacheco será identificada como “design social”. Os rótulos não implicam juízo de valor nem hierarquia quanto às alternativas. Tomei emprestada a noção de “ciência normal” de Thomas Kuhn, de modo a indicar que o paradigma representado pelo Prof. Ronaldo goza de relativo consenso na comunidade de designers, enquanto o design social surgiu da insatisfação de parte da mesma comunidade em relação às respostas oferecidas pelo paradigma dominante.

Nota 2: Este texto ficou mais longo do que eu gostaria e segue sob revisão. Sugestões e críticas são sempre bem-vindas.

2) As atividades do designer na prática do design

Na minha formação na Ufes (1998–2003), os processos de projeto do design normal e design social estavam intimamente relacionados às duas formas de pensar a formação do designer. Entretanto, elas compartilharam os mesmos fundamentos, sugerindo que as encarnações normal-social podem ser problematizações de mais alto nível sobre atividades comuns.

Expressão

Começando pelo começo, os ingressantes em cursos de design passam pela “reeducação do olhar” (a expressão é péssima), seja em disciplinas que trabalham com códigos e linguagens específicas, seja no contato com a história das artes visuais, da arquitetura, do design, dos movimentos e seus expoentes — mais ou menos como “De onde vêm os bebês”, mas estrelando os pais fundadores do design e sem a parte divertida.

A proposta de “reeducar” envolve ao menos duas suposições sobre os calouros: 1) chegariam à universidade com repertório artístico empobrecido ou insuficiente, herança dos níveis de ensino anteriores que dedicam pouco espaço às áreas criativas; 2) precisariam cumprir o ciclo comum de disciplinas que oferecem o ferramental básico para o restante do currículo — desenho de observação (na minha época, dois semestres obrigatórios) e técnico (seguido de mais duas geometrias gráficas), cor, composição e plástica. Na Ufes, a fundação do curso no Centro de Artes em 1997 simplificou a oferta do ciclo comum para designers, uma vez que artes plásticas, artes visuais (então “educação artística”) e arquitetura possuíam aquelas mesmas disciplinas em seus currículos. Estas ofertas “comuns” eram fontes de reclamações (infundadas e juvenis) sobre a “distância” percebida entre nós, alunos, e professores de outras áreas.

A crise de muitos estudantes, no ciclo básico, decorre da auto avaliação sobre suas competências de desenho ou, mais precisamente, de ilustração. “Designer precisa saber desenhar?” era uma dúvida discente recorrente. O uso de computadores para projetar no final dos anos 1990 era fato consumado, então o peso da habilidade manual no desempenho dos futuros designers estava sob disputa. Uma das respostas dos professores na época (no design normal e social) era que “somos designers mesmo se faltar energia”. Este ponto evidencia a primeira atividade do designer na prática do design:

Expressar ideias com habilidade e competência mediante uso de técnicas, códigos e linguagens variadas.

Com ou sem energia, esboçando por observação à mão ou detalhando vistas e cortes em CADs, o designer deve ser capaz de conferir materialidade às suas ideias. A despeito de ter sido elaborado sobre o design gráfico, o raciocínio pode ser aplicado a produtos, moda, digital, serviços e afins. Cada subárea do design tem seu ferramental básico pertinente, sobre o qual o currículo será gradualmente assentado.

As noções de habilidade e competência não são triviais e discuti-las aqui extrapolaria meus objetivos nesta série. Grosso modo, a habilidade está relacionada à destreza e até agilidade para se expressar utilizando aquelas técnicas, códigos e linguagens; a competência é idealizada (p.ex. “sei teoria da cor”) e se manifesta em desempenhos concretos (p.ex. selecionar e combinar cores X e Y no projeto Z para alcançar o efeito W).

Currículos mais recentes, especialmente tecnólogos, abriram mão ou reduziram consideravelmente o espaço para o desenvolvimento dessas habilidades. Algo semelhante acontece em decorrência da disseminação do design thinking, deslocando aquelas habilidades para a periferia da atuação. Retomarei estes problemas ao longo do texto e no prólogo.

Eu cursei quatro semestres de desenho, dois além das obrigatórias. No último deles, Desenho Artístico IV (ministrado por Edu Cozendey, outro nome pioneiro do design capixaba), realizamos o exercício de desenhar veículos parados durante o tempo em que o semáforo em frente ao campus estava fechado. Aguardávamos a luz vermelha, corríamos para a faixa de pedestres e esboçávamos motos, carros e caminhões por 45 segundos. Decidir “o que” desenhar, selecionando as características mais importantes para cada conjunto observado foi um exercício e tanto. Outras disciplinas exploravam diferentes técnicas de abstração e simplificação da forma, da reprodução de imagens com redução ou alteração de cores, da substituição de elementos pictóricos (pontilhismo, colagens, ilustração com tipografia, quem nunca?).

Aquele ferramental básico é o cinto de utilidades do estudante e do profissional. As atividades de desenho, composição, seleção e aplicação de cores são meios para se atingir resultados de mais alto nível na prática de projeto. Mas quais resultados?

Análises e sínteses

Durante a minha graduação, nada foi aprendido de forma mais tácita que o processo de design. Esta expressão apareceu por todo lado, marcando territórios (p.ex. distanciando designers de artistas), apesar de ser raramente problematizada. Ainda hoje é curioso observar que os estudantes sabem que a discussão dos processos de design existe, conseguem “encaixá-los” nos seus fazeres quando intimados, mas a relação não vai muito além das demandas acadêmicas. Em véspera de entrega de trabalho, o processo de design de sucesso é eXtreme Go Horse.

No que diz respeito às duas abordagens que tivemos, nas [poucas] oportunidades de discussão do processo de design durante a prática, houve razoável diferença entre a concepção do problema, os resultados esperados a cada etapa do processo e os respectivos critérios para testes e avaliações.

Figura 1 - Análises e sínteses no processo de design.

A Figura 1 ilustra o processo genérico, linear, dividido em análises que informam sínteses, que por sua vez são alvos de mais análises subsequentes, reduzindo gradualmente a diferença entre as condições iniciais e o objetivo do projeto. A linearidade é mera abstração, pois o processo é marcado por repetições, avanços e retrocessos alternados, momentos de forte aceleração e outros completa estagnação. Elaborei e utilizei este diagrama nas disciplinas introdutórias de projeto do Curso de Design de Produto da UCL, onde comecei a carreira docente. Não é a representação mais completa ou detalhada do processo, mas servirá aos propósitos deste texto.

Por influência das Ciências Cognitivas na segunda metade do século XX, a formulação do processo de design assume que os problemas são majoritariamente mal formados ou capciosos. O estado inicial pode ser desconhecido e afetado por variáveis não observadas. Podemos não ter acesso aos recursos necessários para transformar o estado inicial nos estados intermediários rumo ao objetivo desejado e, para piorar, cada manipulação das variáveis pode transformar o problema em outro diferente. Dificilmente encontraremos problemas bem formados, em que as condições inicial e final são objetivamente conhecidas e temos à disposição todos os recursos para transformar progressivamente um estado em outro.

Figura 2 - Análise dos componentes do problema.

A forma pontilhada representa as incertezas iniciais na definição do problema. Temos ideias vagas sobre as definições candidatas, e especulações sobre a plausibilidade de cada uma desencadeiam possibilidades nos termos dos componentes do problema (seta ‘A’ da Figura 2). Esta análise envolve pesquisas sobre o contexto de uso, necessidades e dificuldades enfrentadas por usuários, materiais e processos produtivos envolvidos, diagnósticos de marketing, consultas a legislações e normas pertinentes. Com a condução das análises, determinados caminhos mostram-se mais viáveis que outros. Ao inferirmos que o problema “parece” um hexágono, quadrados e estrelas tornam-se menos promissoras que círculos e triângulos para alcançar a forma desejada. Se o problema fosse entendido como losango, o quadrado integraria o rol das possibilidades.

No design normal, o problema apresentado ao estudante (ou profissional) pode ser a construção de identidades visuais, sistemas de sinalização, embalagens, sites, projetos gráficos e editoriais, assumindo temas específicos — atividades econômicas, eventos, categorias profissionais, organizações etc. A estratégia didática é elaborada de modo que o estudante possa experimentar etapas importantes do desenvolvimento de produtos típicos da profissão. São demandas objetivas do mundo produtivo, da operação das empresas e da comunicação de massa, nos quais o designer presta seus serviços como qualquer outro profissional. Chama-se o designer sempre que necessário, para fazer o que designers fazem.

O Prof. Ronaldo tinha (e ainda tem) forte atuação no mercado brasileiro de design. As disciplinas que ele ministrou refletiam sua experiência, assim como os casos e exemplos trazidos para a sala de aula. Ainda que os temas fossem sugeridos ou inventados, a experiência profissional dele aterrava as orientações nas práticas do mercado. Nem sempre entendíamos as críticas e, em retrospectiva, lembro da maioria delas e do contexto associado. Acho que o único caminho produtivo de projetos simulados é aquele em que o professor tem bagagem pessoal para conduzir o processo, sob pena de restringir o problema aos aspectos técnicos do design, preferências do docente e ignorar os problemas reais do mundo fora da universidade. Cursos de design sofrem com o desenho da carreira acadêmica das universidades federais — supervalorização de docentes 40h em dedicação exclusiva em detrimento de vagas para pessoas com atuação no mercado.

No design social, o ponto de partida não é a definição ou escolha do problema, mas o encontro com um grupo social. O processo se inicia por meio da aproximação com o outro, seguido da convivência e acompanhamento das atividades de projeto que ele já pratica para enfrentar problemas que ele definiu. Realiza-se levantamento de dados, pesquisa e muita observação, assim como no design normal, embora realizadas na interação com um grupo real, preferencialmente fora dos muros da universidade. Usa-se a metáfora dos “olhos brilhando”, para lembrar que o outro tinha movimento em busca da solução [projetual] para seus problemas antes de nós chegarmos.

Pode ser que os movimentos prévios do grupo tenham produzido identidades visuais, embalagens ou outros projetos típicos de design normal. No entanto, a ênfase do design social não está nas entregas típicas, mas em demandas adequadas ao contexto. Há projetos de arrumação e organização de espaços, de elaboração de dinâmicas, jogos e brincadeiras, sem objetos associados. Em geral, estas aproximações são estabelecidas com ONGs, instituições públicas, associações ou pequenos negócios onde ninguém havia chamado designers, seja pela falta de informação ou de recursos. O designer participa do que os outros faziam sem ele, e que deverão continuar a fazer quando for embora.

A Profª Heliana combinava experiência profissional e vivência na abordagem do design social. Foi sua escola na graduação, objeto de pesquisa no mestrado e seguiu como interesse de pesquisa após ingressar na Ufes. Esta combinação curiosa, do treinamento nos cânones pareado à ruptura com o design normal, gerou discussões interessantes em sala de aula. Ao mesmo tempo em que ela não definia o tema do projeto nem indicava grupos a serem abordados, procurava restringir a complexidade e natureza dos problemas que poderíamos enfrentar a cada semestre.

Processos gerativos

Dos levantamentos iniciais, emerge a geração de hipóteses (Figura 3). É neste momento em que as habilidades de expressão do estudante ou profissional se manifestam, no processo gerativo e especulativo que busca conferir sentido ao conjunto das informações coletadas.

Figura 3 - Geração de hipóteses.

Há múltiplos caminhos possíveis (B), considerando o problema definido na fase anterior, então o trabalho do designer é explorar o maior número deles e [tentar] encontrar aquele com mais chances de satisfazer os requisitos identificados. Esta passagem enunciou a segunda atividade do designer na prática do design:

Produzir sínteses fundadas na análise das variáveis pertinentes ao problema.

A construção de sentido é uma síntese, que procede por estratégias muito distintas no design normal e design social. No primeiro caso, a construção de sentido se dá pela (re)produção do discurso próprio da área, pela autoridade instituída pelo paradigma dominante — o designer é o autor do projeto.

A potência da autoria figura entre as contradições mais interessantes do design normal, dito invisível, objetivo e herdeiro das tradições europeias. Por mais que esta síntese seja orientada por critérios funcionais — organização racional da informação, busca pela “boa forma” e programação sistemática da linguagem visual — a balança decisória pende para o lado do designer. O usuário, quase sempre idealizado, é invocado e descrito nos termos de suas limitações ergonômicas (físicas, cognitivas, organizacionais) para que o contratante compreenda e acate o encaminhamento proposto.

A parte curiosa da negociação sobre o que foi proposto diz respeito à falta de conhecimento do contratante (e do usuário) acerca das justificativas das escolhas do designer. Que atire o primeiro clipart do Freepik o designer que nunca transformou apresentações de projetos em palestras, pois percebeu que seria necessário explicar os aspectos técnicos das decisões e evitar que o esforço de fundamentação fosse invalidado por “respostas subjetivas” (p.ex. “não gostei”) daqueles encarregados de aprovar e pagar o projeto.

No design normal, a famosa frase de Thomas Edison transforma-se em “design é 1% projeto e 99% convencimento”. Como citei no primeiro texto da série, há projetos cujas defesas são baseadas na reputação dos designers responsáveis — sua trajetória, clientes que integram o portfólio, prêmios recebidos e assim por diante. Em certa medida, a reputação dispensaria os argumentos objetivos, uma vez que a “assinatura” seria atestado suficiente da qualidade da entrega. Quem me dera. O design normal demanda ao menos duas construções de sentido a partir dos caminhos possíveis: para o próprio designer/equipe de design e para o cliente (este assunto ficará para o terceiro texto da série, quando discutirei o papel dos usuários e interlocutores).

Em outras palavras, faltaria “reeducação do olhar” (aqui a expressão piora) para clientes e usuários compreenderem o porquê do estado de coisas apresentadas. Nos casos em que esta apresentação-palestra é feita com respeito, sem menosprezar os conhecimentos e experiências anteriores dos interlocutores, o resultado pode ser muito positivo. Faz parte das atribuições profissionais do designer disseminar e democratizar conhecimentos socialmente relevantes sobre suas práticas. Relações profissionais seguintes serão melhores, pessoas envolvidas desenvolverão capacidade crítica de avaliar produtos de design e de participar ativamente de discussões de interesse público na área.

O design social é exatamente o oposto. Enquanto crítica à alienação do designer da realidade no processo projetual, a síntese se desenrola por consensos. As hipóteses são tentativas de mostrar o que os designers entenderam sobre o grupo e seu contexto, utilizando linguagens adequadas ao grupo e não apenas aos paradigmas da área. Os critérios de validação dos caminhos possíveis, dentre os quais surgirá o “partido adotado”, são originados no diálogo entre designers e o grupo em questão. Todos projetam.

Nesse sentido, os casos de sentimentos ambíguos dos alunos quanto às soluções [gráficas] obtidas são frequentes. Muitas geram desconforto em relação aos “cânones” da boa forma, ao mesmo tempo em que representam fortemente os valores e preferências do grupo. Não por acaso, na época da graduação eu me interessei pela retórica da desconstrução no design gráfico.

Figura 4 - Design de Gringo Cardia (1996) para o álbum “Barulhinho Bom” de Marisa Monte.

Várias escolas e profissionais que “desrespeitavam regras” [p.ex. 1, 2, 3, 4, 5] passaram pelo meu radar. Eles não necessariamente praticavam algo próximo do design social, mas exploravam soluções que valorizavam e assumiam linguagens, códigos e técnicas de contextos particulares.

O design social, praticado à risca, enfrenta inúmeras dificuldades para se adequar às demandas reais de serviços prestados em economias capitalistas — os prazos dos projetos são irreais; nem todo contratante quer participar e muitos querem pagar e receber o serviço do “especialista”, para ontem; não há recursos, tempo e interesse por envolver usuários no processo. Não deveria haver surpresas nessa condição, uma vez que a abordagem do design social surgiu como crítica à inserção despolitizada do designer em relações de produção e consumo. Por outro lado, estudantes e profissionais que se identificam com a perspectiva experimentam crises infinitas ao ingressarem no mercado do design normal.

Figura 5 - Geração de alternativas.

Voltando ao processo, com a definição do “partido”, pode-se iniciar a geração de alternativas (C), que consiste na materialização do caminho escolhido com o apoio do ferramental básico do designer. Analógica, digital ou imaterial, a realização da solução requer o detalhamento cada vez mais preciso de desenho, esboços, modelos, esquemas, fluxos e protótipos com variados graus de fidelidade, investigando aspectos estéticos e funcionais de partes ou da totalidade da solução proposta. Avalia-se questões de fabricação, materiais e insumos, montagem e desmontagem, sistemas de componentes, embalagem, estocagem, transporte, exposição, manutenção, descarte… A lista é longa e varia conforme o contexto, explicitando mais uma atividade do designer na prática do design:

Articular requisitos do problema a questões econômicas, sociais e ambientais vigentes.

Poderíamos considerar a tarefa do designer segundo os objetivos do desenvolvimento sustentável, compreendida como um jogo complexo de forças entre cada dimensão do problema.

Figura 6 - Cigarrinhos de Chocolate Pan, criados em 1935.

Por exemplo, certos materiais são baratos e abundantes, apesar de nocivos ao meio ambiente; fornecedores de serviços terceirizados podem ser competitivos ao mesmo tempo em que mantêm pessoas em péssimas condições de trabalho; o nível de personalização esperado pelo consumidor pode ser incompatível com as necessidades de economia de escala; novas tecnologias podem ser tão inovadoras quanto prejudiciais a minorias e grupos invisibilizados. Muitos produtos considerados “inofensivos” há décadas, como cigarrinhos de chocolate, são inaceitáveis para os padrões recentes. A rejeição decorre dos prejuízos à saúde individual e coletiva associados ao tabagismo em geral, e na infância em especial, e mudanças nas preocupações das famílias com o consumo precoce de doces e açúcares no desenvolvimento das crianças.

Para o estudante, realizar tal articulação é extremamente difícil e depende de contribuições de outras áreas na grade curricular, tais como filosofia, antropologia, sociologia, psicologia, economia, administração e marketing. Na Ufes, e provavelmente em muitas universidades federais, estas disciplinas são de responsabilidade de outros departamentos, ficando a critério do professor titular promover discussões pertinentes para os futuros designers. Mesmo com o risco de encontrar conteúdos programáticos indiferentes aos interesses dos nossos alunos, acredito que o contato com os fundamentos de outras áreas sem filtros ainda é melhor que a alternativa do estilo “faculdade” —filosofia para designers, sociologia para designers e propostas similares.

Experimentação

Retomando os requisitos do início do processo (Figura 2, A), a definição do problema a partir da análise do contexto demarca os critérios de satisfação. No design normal, a classificação dos usuários segundo variáveis de segmentação de mercado oferece indícios dos desejos, necessidades, expectativas e hábitos que impactam a satisfação dos requisitos de projeto. No design social, a convivência direta com o grupo oferece dados primários sobre os critérios de satisfação pertinentes para o projeto em desenvolvimento.

Enquanto soluções situadas, resultados do design social fazem mais sentido no universo simbólico e material em que foram geradas. Soluções de design normal tendem a ser menos específicas, na medida em que idealizam o usuário, abstraindo preferências particulares, valorizando desejos e necessidades de grupos mais abrangentes e adotando processos de produção mais padronizados. Evidentemente, a capacidade de articular variáveis em soluções abrangentes ou situadas está apoiada nas atividades citadas anteriormente (expressão hábil e competente, habilidades de análise e síntese) e tende a se desenvolver à medida em que o estudante acumula experiências de projeto.

Conhecimentos aprofundados sobre preferências de mercados, grupos sociais e dinâmicas de setores produtivos específicos são fundamentais para que o percurso, que vai da definição do problema à geração das alternativas, seja cada vez mais competente. Não é por acaso que hoje observamos a demanda de mercado por “designers de X”, onde “X” demarca requisitos. Espera-se que estes profissionais (ou estudantes) estejam sintonizados às exigências econômicas, sociais e ambientais de contextos específicos e conheçam os processos de design empregados para satisfazê-los.

Figura 7 - Experimentação e avaliação da solução proposta.

Mesmo com a condução competente do processo, a pertinência do resultado precisa ser experimentada e avaliada (D) nas duas abordagens. A etapa de testes, experimentação ou avaliação da alternativa reflete as distinções que fiz até aqui, mas também as semelhanças entre design normal e design social. Seja assumindo usuários idealizados ou investigando a pertinência da proposta diretamente com grupos reais, outra atividade do designer na prática do design consiste em

Pesquisar e avaliar a interação das pessoas com a solução proposta, refinando iterativamente as escolhas de projeto.

O primeiro ponto a ser enfatizado quanto aos testes diz respeito ao caráter iterativo: a observação do desempenho do artefato no contexto de uso gera modificações e ajustes que levam o designer a retornar e revisar as etapas anteriores do processo. Dependendo da diferença entre a situação alcançada e a desejada, o retorno pode ser à geração de alternativas ou mesmo ao levantamento de dados inicial. Na verdade, mencionei que a linearidade do esquema deste texto seria uma abstração em razão destas idas e vindas constantes ao longo de todo o processo. Testes são momentos específicos para a revisão de escolhas anteriores, mas não são os únicos. A representação mais adequada do esquema que estou explicando seria assim:

Figura 8 - Idas e vindas no processo.

Pode-se sugerir que a etapa seguinte coloca as decisões anteriores à prova. A dificuldade para gerar de hipóteses adequadas evidencia lacunas nas análises e pesquisas; a geração de boas alternativas depende da seleção acertada do partido; especificações e detalhamentos requerem que as possibilidades construtivas tenham sido extensivamente investigadas. A etapa de testes consiste em avaliações do conjunto das escolhas, do sistema proposto, enquanto as anteriores investigavam elementos isolados e subsistemas.

No design normal, adotamos frequentemente aquele que chamo de usuário estatístico. Projeta-se para as médias, infere-se preferências populacionais a partir de amostras, aposta-se em estereótipos, adota-se o que seria bom para todos e para ninguém. Por mais que técnicas como a criação de personas possam partir de pesquisas com pessoas reais, raramente os perfis idealizados são testados quanto à sua adequação para representar aquele público. Assim como o produto gerado, o modelo de usuário implícito nele pode e deve ser avaliado.

Meu ponto é que os testes envolvem mais do que a validação de aspectos estéticos e funcionais da proposta em questão, devendo explorar a coerência do processo de design como um todo. Afinal, deveríamos acumular experiências sobre o que realizamos e aproveitá-las em contextos futuros que apresentem estados iniciais, variáveis e encaminhamentos possíveis semelhantes. As orientações coletivas realizadas pelo Prof. Ronaldo nas disciplinas evidenciavam a importância de se buscar a coerência do conjunto, mais do que soluções revolucionárias.

Segmentos de mercado, personas e outras estratégias para idealizar pessoas com preferências, hábitos e histórias de vida servem para dar concretude, imaginar cenários relevantes de uso, orientar a formulação de perguntas e obtenção de respostas: o artefato precisa ser testado, mas onde? Como? Por quem? Durante quanto tempo? O que deve ser observado? Como será o registro? Há questões éticas ou legais envolvidas nos testes? Qual o desempenho esperado para o usuário?

As mesmas preocupações são relevantes para o design social. Não obstante, por se tratar de abordagem de ensino, a etapa de testes integra a avaliação dos estudantes na disciplina. A “experimentação”, como é chamada, consiste no momento de colocar o artefato em uso no grupo, observar o desempenho de suas funções e a relação com o entorno. Deve haver abundância de registros em texto e audiovisuais, que serão analisados em busca de possíveis ajustes. Espera-se que o estudante reflita criticamente sobre problemas de projeto e proponha modificações antes da versão final.

A condução do projeto no diálogo permanente com o grupo reduz o escopo dos testes necessários, bem como minimiza a utilidade de técnicas que idealizam o usuário. O grupo está ali, presente e atento, ansioso pela conclusão do processo em que participou ativamente. A prova acontece na realidade objetiva do grupo, que comenta, opina e percebe o que pode ser aprimorado na interação com os estudantes.

Há mais outros dois aspectos avaliados nas disciplinas que adotam o design social. O primeiro diz respeito à autonomia do grupo para continuar o desenvolvimento do que foi proposto após o final do semestre, quando os estudantes deixarão o local. Este tipo de preocupação não existe no design normal, pois espera-se o contrário — o designer fez um bom trabalho na esperança de ser contratado novamente. No design social, se tudo der certo, o designer não será mais necessário (ao menos não naquele problema).

O segundo aspecto corresponde à “adoção” do resultado do processo pelo grupo. A Profª Heliana tinha o hábito de visitar os locais de projeto, perto do final do semestre, para checar se o artefato estava em uso pelo grupo. Essa verificação tirava as dúvidas dela sobre o valor atribuído pelo grupo ao que foi construído, independente da “excelente argumentação” dos alunos na apresentação dos registros dos testes.

Comentei anteriormente que a abordagem do design social tem limitações para ser aplicada em contextos de design normal, na medida em que o envolvimento das pessoas nos termos descritos pode não ser possível ou até inviável. Em alguns cenários, o contratante tem interesse e consegue participar ativamente do processo de projeto, mas o cliente dele, que é o usuário de fato, não consegue.

Imagine vendedores ambulantes, que atuam em diversas áreas e têm clientela variada ao longo do dia; ou pequenos empreendimentos em que o proprietário desempenha muitas funções, sem auxiliares, e cujo público-alvo tem interações muito curtas e limitadas; ou considere a realidade de multinacionais que oferecem produtos e serviços por todo o planeta. Não é impossível envolver os usuários nos termos do design social, embora pareça mais produtivo realizar amostragens a partir de grupos representativos, elaborar perfis aproximados e tentar satisfazer expectativas comuns.

A possibilidade de personalizar aspectos do uso, principalmente em artefatos digitais, pode reduzir bastante os atritos decorrentes da distância entre o usuário idealizado e o concreto. Processos que geram produtos analógicos são eventualmente levados a criar variações de tamanhos, sabores, ingredientes, porções, materiais, estampas, acabamentos e outras possibilidades superficiais (do ponto de vista produtivo), mas que aproximam a oferta das necessidades do usuário. A eficácia da personalização e as variações, como todo o resto, devem ser testadas.

Desenvolvimento contínuo

O resultado do processo de design (Figura 9, E) é um dentre os resultados possíveis. Há muitas maneiras de definir o problema inicial, levando o designer a percursos e desfechos distintos. Os testes, realizados na etapa anterior, avaliam a adequação de uma resposta ao problema delimitado e jamais saberemos se foi a melhor resposta. A articulação das variáveis econômicas, sociais e ambientais gera as respostas viáveis e realizáveis em certo momento. Inovações produtivas, mudanças tecnológicas e gente com ideias frescas podem levar a respostas impensáveis até ontem.

Figura 9 - Implantação.

Assumindo que a proposta foi bem avaliada nos testes, o processo chega à fase de implantação. Evito o termo “entrega” para superar a ideia de que a relação entre designer e contexto de projeto se encerra com a entrega de uma lista de arquivos digitais (sou do tempo que entregávamos o “CD”), com a chegada dos arquivos da gráfica ou com a publicação do site. O desafio ao final dos esforços de projeto consiste em planejar o desenvolvimento subsequente da solução, resistindo às pressões constantes por mudanças.

No design normal, este planejamento é feito por guias de estilo, manuais de identidade visual, brand books, design systems e outras formas de documentação. São conjuntos de orientações sobre o que fazer nas situações conhecidas (p.ex. imprimir mais cartões de visita, alterar telefone na assinatura do e-mail, inserir campos em formulários) e como decidir o encaminhamento em situações inéditas (p.ex. definir estratégia de presença na rede social do momento, lançar novos produtos).

Essas orientações, no design normal, exercem o papel da participação no design social. Uma vez que o interlocutor não participou das atividades construtivas do processo, precisa ser informado sobre como tomar decisões em situações que demandem conhecimentos sobre a construção e manutenção daquilo que foi desenvolvido. Isso não quer dizer que o design social dispense as orientações, mas que a participação ativa fortalece a autonomia do interlocutor para tomar decisões.

A implantação do processo decisório tem complexidade suficiente para ser um projeto em si mesmo. Trata-se da instalação da “cultura de design” na empresa ou grupo, referente à disseminação de conhecimentos, práticas e valores que protejam a solução desenvolvida sem engessá-la. É ajudar o resultado do processo a manter sua identidade na diferença (gosto muito dessa expressão). Alguns profissionais conseguem cobrar por este momento, enquanto são raros os casos de disciplinas que têm espaço no semestre para explorá-lo. O semestre acaba na entrega do trabalho final.

Quando o designer entrega os arquivos, recebe o pagamento (ou nota) e segue a vida, sem preocupações acerca do “pós-projeto”, fatalmente encontrará incoerências no futuro. Os professores Ronaldo e Heliana, nas respectivas abordagens, enfatizavam a importância do cuidado com a implantação. Se a reputação [ou nota] do designer depende da carteira de clientes satisfeitos e longevidade das soluções propostas [ou continuidade do uso pelo grupo], o cuidado com os eventos pós-conclusão do projeto é essencial. Esta é a penúltima atividade do designer na prática do design:

Implantar a solução, elaborando mecanismos de tomada de decisão que mantenham a coerência e permitam o desenvolvimento contínuo da proposta.

Após 16 anos lecionando em cursos de design, acredito que a construção de sistemas coerentes é o aprendizado mais importante e um dos mais penosos para os estudantes. O pensamento sistêmico está mais popular do que nunca no design, e não é por acaso. Os conhecimentos envolvidos na concepção de sistemas coerentes são ainda de mais alto nível, indiferentes à natureza de seus componentes e comuns às abordagens normal e social. A ênfase está nas relações estabelecidas entre componentes e no comportamento emergente do todo, sejam identidades visuais, projetos editoriais ou jogos digitais.

Transferência

A última atividade dos designers, central para a prática do design, consiste em identificar a pertinência de análises, pesquisas, processos gerativos, avaliações e sistematizações anteriores para aplicá-las a novas situações.

Transferir conhecimentos acumulados em experiências de projeto entre situações isomórficas.

Ao término do processo que descrevi (pós-implantação), profissionais e estudantes de design desenvolveram potencialmente habilidades e competências sobre “X”. Para tornar-se “designer de X”, precisarão aprender a reconhecer propriedades de problemas típicos do universo “X”, e manifestar desempenho competente no desenrolar de soluções adequadas para “X”. Seria como encadear dois ou mais esquemas:

Figura 10 - Transferência de conhecimentos entre situações de projeto isomórficas.

Se a transferência ocorre entre projetos, obviamente acontece entre disciplinas na formação do designer. No final das contas, as sínteses que se desenrolam no processo exigem do estudante (ou profissional) a transferência de experiências de aprendizagem anteriores ao contexto imediato do projeto em questão — o ferramental básico; os estudos de história da arte, arquitetura e design; as contribuições das ciências humanas e sociais; a relação com as pessoas, sejam idealizadas ou reais.

Infelizmente, na maioria dos casos estas pontes são construídas por esforço dos estudantes, sem que haja planejamento explícito nos termos de projetos interdisciplinares e integradores. Parte das transferências se dão por osmose (observando professores e colegas), parte são provocadas pela semelhança entre variáveis do projeto e exercícios de disciplinas passadas.

Tenho o hábito de iniciar minhas disciplinas localizando o conteúdo programático na relação com o restante da grade, evidenciando os pré-requisitos que já foram cumpridos para que o estudante esteja ali, para em seguida apontar quais novas habilidades e competências resultarão da disciplina atual e suas aplicações nas posteriores. Resultados parecidos são obtidos ao invocarmos designers e movimentos célebres na área em questão. A história do design é repleta de exemplos de profissionais projetavam como projetavam porque também pintavam; ou porque eram músicos; ou porque estudaram filosofia; ou porque vieram de outras culturas e tinham influências distintas; ou porque não eram designers de formação. Sabemos de onde vêm os bebês, mas a contar a história de cada um não deixa de ser relevante.

De maneira geral, o design normal encadeia melhor as oportunidades para que os estudantes pratiquem as transferências. Objetividade e racionalidade têm suas vantagens heurísticas, pois tudo parece ter função e propósito: a redução da forma facilitaria a representação, a reprodução, a leitura e a interpretação da mensagem. O design social adiciona camadas extras, em certa medida problematizando recursos de base, como a redução, enquanto heurística universal. Ao introduzir a pergunta, coloca em xeque a pertinência do que pode ser transferido indiscriminadamente. Às vezes, profusão e o excesso serão facilitadores da comunicação, e aprender quando é o caso poderá ser útil em situações futuras.

Metadesign, normal e social

No início deste texto, sugeri que a diferença entre as abordagens do design normal e design social seriam problematizações de mais alto nível sobre atividades comuns. Considerando a descrição que fiz das atividades do designer, as abordagens operam como vieses que afetam o design do processo de design e, consequentemente, as práticas do designer. A opção por um ou outro caminho transforma a pertinência de técnicas e ferramentas, altera critérios de satisfação e expectativas, reposiciona os papéis de interlocutores e usuários, e ressignifica a própria condição do designer no processo.

Fui privilegiado por ter sido formado nessas tensões e tento oferecer oportunidades semelhantes aos meus alunos, oscilando [caoticamente] entre ponderações pertinentes aos paradigmas normal e social. A formação rigorosa nos cânones do design normal qualifica as habilidades expressivas; a postura crítica do design social problematiza a expressão de acordo com o contexto; a racionalidade e objetividade das análises e sínteses tentam revestir com cientificidade o processo, escolhas e testes; a convivência com o grupo humaniza o processo, aterra as escolhas do designer nas contradições da realidade e o mantém alerta sobre suas responsabilidades.

Prólogo

Este segundo texto explicitou meu apreço pela formação adequada no ferramental básico, compartilhada com as artes e a arquitetura. Também espero ter evidenciado as contribuições essenciais das ciências humanas e sociais à atividade do designer. Sendo assim, meus argumentos rejeitam certas concepções de design, a saber:

  • Instrumentalização do design como mero agregado de métodos e técnicas, ignorando a centralidade das habilidades de expressão e do conhecimento da história da arte e das humanidades para a seleção e condução adequadas de métodos e técnicas disponíveis;
  • Redução da formação a um único “X”, restringindo as oportunidades de transferências entre situações de projeto e empobrecendo o repertório projetual daquele mesmo “X”. A formação ideal deveria ser orientada aos processos e não somente aos produtos da atividade do designer, de maneira que a competência em “X” seja fruto da diversidade de experiências de projeto e não da repetição de técnicas de nicho;
  • Adoção do design normal em detrimento do design social e vice-versa. As tensões entre autoria e participação, objetividade e subjetividade, prestação de serviços e convivência, distância e proximidade são fontes do potencial transformador do design.

Presenciamos a captura do discurso “humanizado” do design por grandes grupos econômicos, da mesma maneira que o discurso “objetivo” foi cooptado no século passado. Todas as marcas são colaborativas, empáticas e preocupadas com o futuro das nossas crianças, como já foram racionais, econômicas e preocupadas com o equilíbrio perfeito entre forma e função. Não há vilões confabulando na sala de controle do design do mal, como não há anjos tocando trombetas para anunciar o paraíso do design.

Processos de design não são soluções de tamanho único, aplicáveis a qualquer situação de projeto, por mais que as narrativas atuais tentem propagar o contrário. É a delimitação do problema pelo designer que enuncia o processo e não o inverso. Considerem as práticas das empresas que melhor aderiram ao discurso do design thinking. Observem as relações delas com seus clientes e comunidades afetadas por suas operações. Design, para essas marcas, é uma estratégia de redução de danos que será prontamente substituída quando a moda passar, ou quando houver outra novidade para humanizar o desumano.

Não se trata de politizar o design. Toda prática de design e suas atividades constituintes materializam concepções de mundo dos designers envolvidos e chocam-se com as concepções de interlocutores e usuários. São relações inevitavelmente políticas, por ação ou omissão.

A seguir

A condição do usuário e seus interlocutores no processo (parte III).

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Hugo Cristo
Hugo Cristo

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